segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A verdadeira despedida


Hoje eu fui a um funeral. E, como sempre, saí renovada de lá. Aliás, sempre vou a funerais de pessoas conhecidas. Primeiro porque tenho medo de que, no meu, ninguém vá consolar meus filhos. Segundo, porque acredito que não conhecemos as pessoas à toa. Tudo tem uma razão de ser. Em um mundo com cerca de sete bilhões de terráqueos, porque Deus permitiu que eu conhecesse justamente aquele que acaba de morrer?
No mínimo, tal ente merece minha reverência e não há homenagem mais honesta do que ir a um funeral. É triste, desolador, incômodo, enfim, deprimente. Quem vai, com certeza, tem boa intenção.
Funerais também me impressionam pela logística. Parecem até óperas ou espetáculos teatrais, com todo respeito. Tem drama, tem lágrimas, tem mocinha, tem música, tem enredo, tem plateia, tem aplausos e, acreditem, tem vida.
“Minha filha, saudades eternas”. Li essa mensagem em uma lápide durante o cortejo e chorei. Fiquei tão comovida com a tristeza daquela mãe que nem sei quem é; se ainda está viva; em que condições perdeu sua filha; se era criança ou adulta... Entendo seu drama e rezei por ela. Se ela já tiver morrido, a oração deve ser redirecionada para alguém que precise.
Conforme segue o cortejo, as fotos de todas aquelas pessoas mortas parecem nos seguir e nos lembrar que um dia estaremos naquele lugar e que, portanto, temos que aproveitar o tempo que nos resta. Amar muito, perdoar muito, não perder tempo com futilidades e escrever uma história digna de um epitáfio que emocione quem passar por lá.
Muitas dúvidas pairam sobre os participantes de um funeral. Uma das primeiras é sobre onde colocar as mãos. Ficamos tão pasmos diante daquela situação! Parece que nunca ninguém está preparado para enfrentar e mal sabemos como nos portar. Na maioria das vezes, a opção é abraçar quem estiver mais perto. Salva a si mesmo e ainda consola o outro.
Outra dúvida é sobre o quê dizer para os familiares. Muitas vezes, falam-se sandices, como por exemplo, perguntam-se: “oi, tudo bem?”
Essas ocasiões são excelentes oportunidades para reencontrar pessoas que não vemos há anos, como aquela tia de terceiro grau; a vizinha que se mudou; os primos que só conhecemos quando crianças. Colocam-se o assunto em dia e ensaiam-se até alguns sorrisos.
Nos funerais, viúvas se tornam protagonistas, coitadas. Não podem nem sofrem em paz, porque ninguém tira o olho delas. Os presentes olham com piedade, mas também como se vigiando para saber se estão realmente sofridas, se ainda têm charme suficiente para um novo casamento, se o figurino está adequado para a ocasião...  Quanta futilidade passa pela cabeça das pessoas enquanto estão em funeral! Mas também passam reflexões decisivas.
Estranho quando alguém diz que não vai a velórios e enterros porque não gosta, não se sente bem ou vai ficar impressionado. Será que é diferente para alguém? É óbvio que enterros são tristes, ninguém gosta, se sente bem ou deixa de ficar impressionado. Ninguém vai a funeral porque gosta, mas porque precisa. Exercício de solidariedade aos familiares, homenagem aos mortos e principalmente reflexão de que um dia chegará a nossa vez e, portanto, é bom nos preparamos.
Impressiona também a beleza das coroas de flores e das mensagens escritas. Porém, que pena, são sepultados com o cachão. Percebi que em muitas sepulturas havia flores de plásticos. Talvez, os veteranos na experiência de enterrar seus mortos optem pelas flores de plástico porque sabem que elas não morrem jamais.
Se quisesse, escreveria aqui vários detalhes que me impressionam nos funerais, mas vou terminar destacando um. Como em nenhum outro evento, nos funerais, as pessoas deixam os sentimentos mais sinceros fluirem sem pudor algum.
Ocasião propícia para dizer “até logo” ao que parte para a nova jornada. A verdadeira separação, como disse uma pessoa querida, mas momentânea separação.
Sinto cheiro de vida nos funerais. Saio deles com uma vontade enorme de viver.
O mais espetacular de tudo é ver como as pessoas que perdem seus entes queridos conseguem reiventar sua história de vida. Afinal de contas, a vida continua e o espetáculo não pode parar.
Bravo! Bravo!


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